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Alterações na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e as Possíveis Influências no Direito Tributário – Lei 13.655/2018

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Com o intuito de aperfeiçoar as decisões proferidas nas esferas administrativa e judicial, bem como trazer segurança jurídica e eficiência na aplicação do direito público, foi sancionada no final de abril a Lei nº 13.655/2018, que introduz disposições no Decreto-Lei nº 4.657/1942, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).

Com a edição de uma nova norma, sempre surgem dúvidas quanto aos resultados de seu cumprimento, as consequências jurídicas que poderão ser verificadas nas relações por ela influenciadas, bem como se esta cumpre seu papel que, no presente caso, é o de aperfeiçoar a administração do Direito Público na sociedade.

Os dez artigos inseridos na LINDB trazem novas disposições quanto aos Atos Administrativos, sanções e decisões proferidas nas matérias que envolvam Direito Público e seus agentes, influenciando, consequentemente, os litígios tributários travados entre o contribuinte e o Fisco, em todos os âmbitos federativos.

 

Prioridades e Disposições da Nova Lei – O Que Muda no Direito Tributário

Trazendo à baila alguns conceitos abstratos e de difícil compreensão, a nova Lei basicamente coloca o chamado “interesse público e social” como prioridade nas relações de Direito Público.

No âmbito do Direito Tributário, essa priorização pode ser interpretada de forma mais ou menos favorável tanto ao Fisco como ao contribuinte, a depender da relação jurídica face a qual será interpretada.

Nesse sentido, acreditamos que três dispositivos da Lei 13.655/2018 merecem destaque, sobre os quais teceremos breves comentários com o fim de alertar o contribuinte sobre possíveis mudanças no comportamento dos agentes públicos, bem como dos julgadores, em âmbito administrativo e judicial.

  • 23. A decisão administrativa, controladora ou judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito, deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais.

A interpretação do dispositivo em comento traz, sem dúvidas, segurança jurídica ao contribuinte e ao agente quando da adoção de uma nova política pública ou situação jurídica diametralmente diversa à que vinha sendo aplicada anteriormente, impondo a adoção de um regime de transição para que esse novo direito seja cumprido de forma harmônica e efetiva.

Esse regime de transição imposto garante que mudanças jurisprudenciais inesperadas não surpreendam o administrador e o contribuinte, alterando, repentinamente, situações jurídicas que há anos estavam consolidadas.

Não obstante o dispositivo em comento dê como certa a possibilidade quanto à modificação de orientações e direitos, as situações plenamente constituídas não poderão ser invalidadas por atos posteriores, conforme garante o artigo 24 da lei.

  • 28. O agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.

Primeiramente, é importante rememorar que, de acordo com o disposto nos artigos 1º e 2º da Lei 8.429/92, entende-se por agente público todo aquele que exerça mandato, cargo, emprego ou função nas entidades da administração direta, indireta ou fundacional de qualquer um dos Poderes da Federação.

Muito embora a conduta dolosa seja de difícil comprovação e dependa desta para ser atribuída ao agente, a sua responsabilização pessoal quando verificado erro grosseiro nas decisões e pareceres por este proferidos, se interpretada de forma ampla, poderá condicionar de forma significativa a conduta dos Agentes Fiscais.

Não raramente os contribuintes se deparam com autuações mal formuladas, nas quais sequer é possível identificar a origem do suposto crédito tributário, contendo, ainda, erros quanto à indicação da infração fiscal cometida, incertezas quanto à ocorrência do fato gerador e, muitas vezes, pretendendo a cobrança de débitos nitidamente prescritos.

Até que o contribuinte consiga demonstrar a inconsistência desta autuação repleta de vícios, muitas vezes já terá sofrido sanções administrativas, tais como apontamentos fiscais e a negativa na emissão de certidões de regularidade fiscal, por exemplo.

Ainda que o contribuinte não pleiteie a aplicação de sanção pessoal direta ao Agente Fiscal que lavrar em seu desfavor um auto de infração evidentemente viciado, o dispositivo em comento poderá estimular o administrador a adotar uma conduta mais cautelosa, inibindo-o de proceder a autuações carentes de embasamento legal e, muitas vezes, evidentemente indevidas.

  • 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.

Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas.

Não por acaso os comentários ao primeiro dispositivo introduzido pela nova lei foram deixados para o final, uma vez que, por fazer referência a conceitos e valores jurídicos abstratos, já foi objeto de análise por diversos juristas, que levantaram diferentes polêmicas quanto à sua aplicação.

Isso porque há aqueles que acreditam que a intenção do legislador, ao editar o dispositivo em comento, foi o do restringir o uso indiscriminado de conceitos jurídicos e princípios constitucionais sem motivação especifica. Em contrapartida, há quem acredite no risco de que a aplicação de princípios constitucionais de direito fundamental, em determinada situação jurídica, possa ser deixada de lado quando comparado ao interesse maior do Estado.

Com a obrigatoriedade da vinculação da decisão proferida pelo julgador à análise prévia de possíveis consequências sociais e jurídicas, quando esta estiver fundamentada em “valores jurídicos abstratos”, este, ao decidir com base em conceitos constitucionais como o interesse político e social, a segurança jurídica e princípios como a legalidade, anterioridade, e proporcionalidade, por exemplo, deverá demonstrar a adequação da nova medida jurídica imposta, inclusive em comparação com possíveis alternativas.

Essa é uma medida que guarda consonância com disposições do Novo Código de Processo Civil que, em seu artigo 489, inciso II, especificamente, classifica como não fundamentada a decisão que empregue conceitos jurídicos indeterminados ao fato, sem explicar a sua relação com a causa, impondo ao magistrado que exponha a relação do fato com a norma e o raciocínio jurídico adotado para alcançar determinado entendimento.

Apesar da constante aplicação análoga do diploma à esfera administrativa, a introdução de dispositivos semelhantes à LINDB, além de reforçar o que já vinha sendo imposto pelo CPC, vincula também os julgadores dos órgãos administrativos a fundamentarem suas decisões e racionalizarem que a aplicação da norma terá uma consequência futura àquele ao qual determinada decisão está direcionada, aperfeiçoando a relação jurídica e, muitas vezes, evitando a prolongação do litígio.

No entanto, impor ao julgador que, obrigatoriamente, leve em consideração consequências jurídicas extremas ao proferir uma decisão, poderá vir a convalidar episódios de manifesta inconstitucionalidade, refletidas em situações em que o ente federado procede à cobrança indevida de um tributo, passível de conferir ao contribuinte o direito de restituição.

Frequentemente nos deparamos com as alegações de cunho financeiro por parte das Fazendas Públicas, que apelam para o interesse econômico social sustentando a inviabilidade de procederem à restituição de tributos recolhidos indevidamente pelos contribuintes, em razão de supostas consequências desastrosas aos cofres públicos.

Dessa forma, caso o julgador leve em consideração o referido argumento, adotando como valor jurídico abstrato o suposto interesse público por trás do eventual prejuízo ao Erário alegado pelas Procuradorias, leis que majoram e instituem tributos de forma inconstitucional lesariam contribuintes que, obrigados ao recolhimento do tributo até o momento em que sobrevenha uma causa suspensiva, perderiam os valores que já foram inadequadamente destinados às Fazendas, uma vez que não teriam direito ao indébito.

Sendo assim, verifica-se que o dispositivo introduzido à LINDB, não obstante traga segurança jurídica às relações litigiosas, com a consequente construção de uma jurisprudência mais fundamentada e objetiva, pode enfraquecer, ainda mais, a relação entre os contribuintes e as Fazendas, se utilizados por estas como forma de perpetuar a cobrança desenfreada de tributos de forma inconstitucional.

 

Consequências à Aplicação da Nova Lei

Muito embora alguns dispositivos tenham efetivamente cumprido o papel de aprimorar as relações jurídicas de Direito Público, há de se observar que determinadas interpretações vão de encontro aos interesses do contribuinte e dependerão diretamente de como será construída a jurisprudência diante da aplicação da nova lei, e se esta realmente será observada pelos agentes da administração.

Cabe aos operadores do Direito fiscalizarem como os novos dispositivos surtirão efeito diante dos litígios entre o Fisco e os contribuintes, bem como a influência que terão sobre o comportamento do agente público e da administração.

 

Equipe Tributária do Molina Advogados

Autora: Patricia Blanco C. De Aguiar, advogada do Contencioso Tributário.

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